quarta-feira, 24 de junho de 2015

Uma xícara, muita história

Pesquisando por aí achei este texto interessante.


POR MARTA BARBOSA

O tempo passa depressa quando se está em Londres. Aliás, a capital inglesa parece ficar sempre alguns passos à frente do resto do mundo, lançando moda, música, costumes. Isso não significa que as tradições não estejam enraizadas, a exemplo de qualquer outro canto da Inglaterra. E é por isso que Londres é Londres. O chá das 5, por exemplo, é uma instituição inglesa por excelência. Um costume que remonta ao século XVII e até os dias de hoje conquista todo tipo de gente. O que pode haver em comum entre o roqueiro de Nothing Hill, o executivo atarefado de Westminster e a senhora interessada em arte de Mayfair? Todos eles, se tiverem uma folguinha no final do dia, se renderão a uma boa xícara de chá preto, com algumas gotas de leite gelado e uma infinidade de guloseimas mais que deliciosas, que compõem o tradicional chá inglês.
Muitas histórias cercam esse costume. A começar pela própria origem. A tese mais bem aceita é que a criadora foi uma portuguesa. Dizem que Catarina de Bragança, recém-casada com Carlos II, pegou um resfriado logo em seus primeiros dias em terra inglesa (absolutamente possível considerando o tempo instável no país). Pediu que lhe servissem uma bebida quente quando ninguém na corte tinha esse costume. As damas de companhia lhe trouxeram ervas chinesas, ensinaram como fazer a imersão em água quente e, para agradar a princesa portuguesa, serviram a bebida acompanhada de doces. Foi Catarina também, dizem, quem ordenou a troca dos pratos e canecas de metal, usados na época, por porcelana chinesa. E instituiu alguns sabores que não podiam ficar de fora da mesa, como as geleias (a de laranja era sua preferida). Nascia assim uma tradição.
A louça caprichada, as geleias e as ervas trazidas do Oriente ainda estão lá, intactas. De resto, algumas mudanças tornaram a tradição inabalável na sucessão dos anos. Por exemplo: a hora de servi-lo. “Aqui servimos entre 3 e 6 da tarde durante a semana e a partir da 1 da tarde nos fins de semana”, diz Nina Colls, diretora de comunicação do Brown’s Hotel, cujo serviço foi eleito o melhor de Londres pelo The Tea Guild’s Top London Afternoon Tea 2009, o Guide Michelin do mundo do chá. “Recebemos todo tipo de cliente, desde turistas (os japoneses adoram!) a casais de namorados, grupos de senhoras, jovens amigos”, afirma Fabien Ecuuillon, chef-pâtissier do Brown’s.
Ruibarbo? What is this?
Para ganhar tão variado paladar, Fabien muda as receitas dos doces periodicamente, seguindo o que os mercados podem oferecer de mais fresco. Quando a equipe de Prazeres da Mesa esteve no Brown’s, era época de ruibarbo na Inglaterra (erva nativa da China). “Aproveitei a oferta e criei uma compota de ruibarbo, que é servida com panacotta de mel”, diz o chef, que revelou essa e outras receitas do cardápio com exclusividade. Outra inovação do chá das 5, essa não exclusividade do Brown’s, é acrescentar algumas taças de champanhe (rosé, normalmente) à abertura do serviço. Por 48 libras por pessoa (aproximadamente 150 reais), o luxo está garantido.

O título de melhor chá de Londres não veio por acaso. Inaugurado em 1837, o Brown’s foi o primeiro hotel construído para receber os lordes da Inglaterra. É um cinco-estrelas charmoso, mas sem excessos. O salão de chá, com uma biblioteca anexa, tem decoração sóbria, ao mesmo tempo clássica e moderna, e um longo repertório. Ali Agatha Christie escreveu O Caso do Hotel Bertram e Alexander Graham Bell fez sua primeira ligação telefônica. A atmosfera tem o peso da história. E por mais modernidade que exista na Londres do lado de fora, naqueles minutos diante do carrinho de chá, a gente se sente um pouco parte dos livros.

http://prazeresdamesa.uol.com.br/uma-xicara-muita-historia/

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